ORANIAN
Òrànmíyàn (Oranian) foi o filho mais novo de Odùduà e tornou-se o mais poderoso de todos eles; aquele cuja fama era a maior em toda a nação iorubá. Tornou-se famoso como caçador desde a juventude e, em seguida, pelas grandes, numerosas e proveitosas conquistas que realizou. Foi o fundador do reino de Oyó. Uma de suas mulheres, Torosí (Torosi), filha de Elempe, o rei da nação Tapa (ou Nupê), foi a mãe de Xangô, que mais tarde, subiu ao trono de Oyó. Oranian instalou um outro filho seu. Eweka, como rei em Benim, tornando-se ele próprio Óòni de Ifé.
Oranian foi concebido em condições muito singulares, que, sem dúvida, espantariam os geneticistas modernos. Uma lenda relata Omo Ogum, durante uma de suas expedições guerreiras, conquistou a cidade de Ogatún, saqueou-a e trouxe um espólio importante. Uma prisioneira e rara beleza chamada Lakanjê agradou-lhe tanto que ele não respeitou sua virtude. Mais tarde, quando Odùduà, pai de Ogum, a viu, ficou perturbado, desejou-a por sua vez e fez dela uma de suas mulheres. Ogum, amedrontado, não ousou revelar a seu pai o que se passara entre ele à bela prisioneira. Nove meses mais tarde. Oranian nascia. Seu corpo era verticalmente dividido em duas cores. Era preto de um lado, pois Ogum tinha a pele escura do outro, como Odùduà, que tinha a pele muito clara.
Essa característica de Oranian é representada todos os anos em Ifé, por ocasião da festa de olojo, quando o corpo dos servidores do Óòni é pintado de preto e branco. Eles acompanham Óòni de seu palácio até Òkè Mògún, a colina onde se ergue um monólito consagrado a Ogum. Essa grande pedra é cercada de màrìwò òpè, franjas de palmeiras desfiadas, e, nesse dia, os sacrifícios de cão e galo são aí pendurados. Óòni chega vestido suntuosamente, tendo na cabeça a coroa de odùduà, É uma das raras ocasiões, talvez mesmo a única do ano, em que ele a usa publicamente, fora do palácio. Chegando diante da pedra de Ogum, ele cruza por um instante sua espada com Osògún, chefe do culto de Ogum em Ifé, em sinal de aliança, apesar do desprazer experimentado por Odùduà quando descobriu que não era o único pai de Oranian.
Oranian, como já dissemos, foi o fundador da dinastia dos reis de Oyó. O mito da criação do mundo tal como é contado em Oyó atribui-lhe esse ato e não a Odùduà.
Estes dois personagem são os fundadores das respectivas linhagem reais de Oyó e de Ifé, o que bem demonstra que o mito da criação do mundo é, de uma lado e outro, o reflexo da lenha histórica da origem das dinastias que dominam nesses dois reinos.
A supremacia estabelecida por Oranian sobre seus irmãos nos é narrada em uma lenda recolhida no século passado Oyó:
“No começo, a terra não existia… No alto era o céu, embaixo era a água e nenhum ser animava nem o céu nem a água. Ora, o todo-Poderoso Olodumaré, o senhor e o pai de todas as coisas… criou, inicialmente, sete príncipes coroados… Em seguida… sete sacos nos quais havia búzios, pérolas, tecidos e outras riquezas. Criou uma galinha e vinte e uma barras de ferro. Criou, ainda, destro de um pano preto, um pacote volumoso cujo conteúdo era desconhecido. E, finalmente, uma corrente de ferro muito comprida, na qual prendeu os tesouros e os sete príncipes. Depois, deixou cair tudo do alto do cér… No limite do vazio só havia água… Olodumaré, do alto de sua morada divina, jogou uma semente que caiu na água. Logo, uma enorme palmeira cresceu até os príncipes, Oferecendo-lhe um abrigo grande e seguro, entre as suas palmas. Os príncipes se refugiaram ali e se instalaram com suas bagagens. Eram todos príncipes coroados e conseqüentemente, todos queriam comandar. Resolveram separar-se. Os nomes desses sete préncipes eram: Olówu, que se tornou rei do Egbá; Onisabe, que se tornou rei de Savé; Orangun, que reinou em Ila; Óòni, que foi soberano de Ifé; Ajero, que se tornou rei de Ijerô; Alákétu, que reinou em Kêto; e o último criado, o mais jovem, Òrànmíyàn, que se tornou rei de Oyó.
Antes de se separarem para seguirem seus destinos, os sete príncipes decidiram reparti entre eles a soma dos tesouros e das provisões que o Todo-Poderoso lhes havia dado. Os seis mais velhos pegaram os búzios, as pérolas, os tecidos e tudo o que julgaram precioso ou bom para comer. Deixaram para o mais moço o pacote de pano preto, as vinte e uma barras de ferro e a galinha… Os seis príncipes partiram à descoberta nas folhas de palmeira. Quando Oranian ficou sozinho, desejou ver o que continha o pacote envolto no pano preto. Abriu-o e viu uma porção de substância preta que ele desconhecia… sacudiu então o pano e a substância preta caiu na água e não desapareceu. Formou um montículo. A galinha voou para pousar em cima. Ali chegando, ela pôs-se a ciscar essa matéria preta, que se espalhou para longe. E o montículo se ampliou e ocupou o lugar da água. Eis aí como nasceu a terra.
Oranian apresou-se em descer para o domínio, assim formado pela substância negra, e tomou posse da terra. Por sua vez, os outros seis príncipes desceram da palmeira. Quiseram tomar a terra de Oranian, como já lhe haviam tomado, na palmeira, sua parte dos búzios, das pérolas, dos tecidos e dos alimentos… Mas Oranian tinha armas; suas vinte e uma barras de ferro haviam se transformado em lanças, dardos, fechas e machados. Com a mão direita, ele brandia uma longa espada, e lhes dizia: “Esta terra é só minha. Lá em cima, quando me roubaram, vocês me deixaram apenas esta terra e este ferro. A terra cresceu e o ferro também; com ele defenderei a minha terra! Vou matar todos vocês. Os seis príncipes pediram clemência, rastejaram aos pés de Oranian, suplicantes. Pediram-lhe que cedesse uma parte de sua terra para que pudessem viver, e continuar príncipes… Oranian poupou-lhes a vida e deu-lhes uma parte da terra. Exigiu apenas uma condição: esses príncipes e seus descendentes deveriam permanecer sempre seus súditos e de seus descendentes; deveriam, todo ano, vir presta-lhe homenagem e pagar os impostos na sua cidade principal, para demonstrar e lembrar que eles tinham recebido, por condescendência, a vida e sua parte de terra. Eis aí como Oranian tornou-se rei de Oyó e soberano da nação iorubá é, de toda a terra.”
Porém, Ifé reivindica a preponderância sobre Oyó. É em Ifé que está guardado o sabre de Oranian, chamado “sabre da Justiça”, que os reis de Oyó devem segurar nas mãos durante as cerimônias de entronização, para garantir sua futura autoridade.
Vêem-se ainda em Ifé duas outras relíquias de Oranian: um grande monólito, o Òpá Òrànmíyàn, seu escudo.
Fonte: Pierre Fatumbi Verger